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RETRATO DO ARTISTA QUANDO JOVEM

Entrei no mundo à quinta-feira, a 12 de Outubro de 1950, sem pressa, um parto de risco, na Casa de Saúde de Amares, terra natal de meus pais que, a esse tempo, viviam na velha rua dos Pelames, à Cividade, em Braga.

Vergilio A. Vieira   Vergilio A. Vieira  

A notícia chegou, ao fim do dia, à Repartição da Fazenda Pública pela voz do médico que falava, segundo penso do outro lado do mundo, enquanto (e como diria Federico García Lorca, o poeta de Fuente Vaqueros) Los instantes heridos/ por el reloj pasaban

Vergilio A. Vieira   Vergilio A. Vieira  

Hoje, não sei se meu pai se meteu a caminho e me viu nesse dia, onde viria a estar horas depois já que, a treze desse Outubro distante, me baptizaram na Igreja Matriz da vila, e arciprestado.

  Vergilio A. Vieira    

Da cidade para onde me trouxeram dias mais tarde, e onde viveram meus pais até 1954, só viria a guardar recordações, bastantes anos mais tarde, quando deixei a terra e me confiaram aos padres diocesanos, aí por 1962, sofrida ausência de que nunca mais me havia de esquecer.

Apesar de, e como em tempos já disse, os livros terem sido a irmã que não tive, vivi uma infância feliz: severa, para lá da triste condição de filho único, que os pais temiam perder; amada, tanto quanto vim a saber, por quem tanto me queria.

Vergilio A. Vieira   Vergilio A. Vieira  

As leituras foram, desde cedo, o meu anjo da guarda, e o desejo de liberdade, reconheço-o agora, essa fera amansada que nunca soube distinguir o lado de dentro do lado de fora das grades de um sonho feito de enganos: um sonho, de que a manhã é tarde, à tarde de que o dia é noite.

Vergilio A. Vieira   Vergilio A. Vieira  

Pelos livros viajei, sempre numa viagem sem fim. Por isso, lhes devo tudo o que sou: velejador das noites brancas, que a travessia dos anos conciliou consigo e com o mundo, entre naufrágios, perdas de rumo, perdidos céus de vários tempos e lugares.

Vergilio A. Vieira   Vergilio A. Vieira